Agora é guerra: Ucrânia concentra tropas na fronteira, OTAN manda mais caças e navios para região e guerra está por um fio

Na linha de frente, ucranianos se preparam para possível ataque da Rússia

A cerca de 500 metros de separatistas apoiados pela Rússia, um grupo de soldados ucranianos espera por uma luta que certamente está por vir.

E parece que eles estão estranhamente tranquilos com tudo isso, de acordo com o fotógrafo Timothy Fadek, que passou um tempo com esses homens, nessa sexta-feira (21), na linha de frente na região leste de Luhansk, na Ucrânia.

“Eles abraçaram a inevitabilidade”, diz Fadek. “Estava conversando com um dos soldados e ele disse: ‘É inevitável. Nós aceitamos a inevitabilidade de um ataque.’ E então houve uma pequena discussão entre dois soldados e um deles falou: ‘Os russos não atravessarão a fronteira, eles atacarão do mar’, referindo-se ao Mar de Azov. Outro soldado discordou dessas duas avaliações e argumentou que, não, ‘o ataque virá da Bielorrússia.’”

  • 3 de 11Soldados ucranianos sentam-se na traseira de um

Mesmo não concordando com a origem do ataque, todos estão 100% convencidos de que ele acontecerá.

“Eles se resignaram”, continua o fotógrafo. “Mas estão extremamente relaxados. Não há uma pitada de nervosismo em seus rostos. Todos estão prontos para lutar, prontos há muitos anos. Mas eu perguntei: ‘Vocês querem esta guerra?’ E eles responderam: ‘Claro que não’”.

As tensões entre a Ucrânia e a Rússia estão em seu ponto mais alto, com um acúmulo de tropas russas perto da fronteira estimulando temores de que Moscou possa iniciar em breve uma invasão. O Kremlin negou que esteja planejando atacar, argumentando que o apoio da Otan à Ucrânia constitui uma ameaça crescente no lado ocidental da Rússia.

“Em Muratova, uma cidade ucraniana a cerca de 20 minutos de carro das linhas de frente, as pessoas estão muito mais preocupadas do que os soldados”, revela Fadek. Mas também parecem conformadas com o seu destino.

“Quando perguntei a um fazendeiro o que ele pensa sobre a possibilidade de um ataque, ele deu de ombros.”

“Vai acontecer. E não não há nada que alguém possa fazer para impedir.”

Guerra

“O caráter dessa concentração indica a preparação para ações ofensivas e, realmente, tal ameaça existe atualmente”, afirmou o porta-voz russo, Dmitry Peskov24 de janeiro de 2022, 10:38 h Atualizado em 24 de janeiro de 2022, 10:49

Kiev está concentrando muitas forças e equipamento militar na linha de contato em Donbass, o que indica a preparação de ações ofensivas, disse o porta-voz presidencial russo, Dmitry Peskov, na segunda-feira (24).

“Realmente, as autoridades ucranianas estão concentrando uma enorme quantidade de forças e equipamento na fronteira com as repúblicas autoproclamadas, na linha de contato. Realmente, o caráter dessa concentração indica a preparação para ações ofensivas e, realmente, tal ameaça existe atualmente”, declarou Peskov.

Hoje, segunda-feira (24), houve relatos de que a OTAN está aumentando sua presença no Leste Europeu devido à situação em torno da Ucrânia, e também está colocando suas forças em alerta.

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“Tais ações da OTAN e o aumento de atividade da Aliança Atlântica nas proximidades de nossas fronteiras não podem ser ignoradas pelos nossos militares, que são responsáveis pela segurança de nosso país.”

Ao responder à questão se o começo dos exercícios no mar Báltico foram uma resposta recíproca ao deslocamento das tropas adicionais da OTAN para a região, o porta-voz afirmou: “Há um processo contínuo de exercícios, manobras, construção militar que nunca parou e vai continuar”.

Segundo o porta-voz, a escalada em torno da Ucrânia não acontece por ações da Rússia, mas sim pela “histeria informacional” e também pelas ações do bloco e dos EUA. Conforme suas palavras, a situação “é enquadrada por enorme quantidade de informação falsa”.

“Houve uma rodada de histeria. Mas ao final tudo isso acabou com recomendações do Departamento de Estado. No tocante às ações concretas, nós vemos as declarações publicadas pela Aliança Atlântica sobre o aumento do contingente e concentração de forças e equipamento para o flanco leste. Tudo isso resulta em aumento de tensão”, ponderou.

Ele ressaltou mais uma vez que tudo isso não se desenvolve devido à atividade russa, mas pelo que “faz a OTAN, Estados Unidos, e devido à informação que eles espalham”.

Além do mais, ele constatou que a entrega de cada unidade de armamento para a Ucrânia inspira mais uma vez as “cabeças quentes” em Kiev para o início da operação militar em Donbass

Mas o presidente Vladimir Putin está tomando medidas ante a crise, afirmou Peskov.

“O chefe de nosso Estado, como comandante supremo e como a pessoa que determina a política externa de nosso país, ele está tomando as medidas necessárias para que nossa segurança seja mantida no nível adequado, para que nossos interesses sejam assegurados.”

O porta-voz relembrou também que foi a Rússia quem tomou a iniciativa das negociações sobre segurança. O Kremlin está preocupado com a situação em Donbass e quer que todos exortem Kiev a nem sequer pensar na possibilidade de resolver o conflito pela força, acentuou Dmitry Peskov.

Comunicado divulgado pelo bloco nesta segunda-feira (24) informa que os países aliados estão de prontidão e vão enviar mais navios e caças para a região.

No comunicado, a OTAN informou que a Dinamarca está enviando fragatas para a região do Báltico e também está preparada para enviar caças F-16 à Lituânia. A Espanha também está fortalecendo a força naval da OTAN e a Holanda confirmou a chegada de aeronaves F-35 na Bulgária em abril.

“Agradeço aos aliados que contribuem com forças adicionais para a OTAN. A OTAN vai continuar tomando todas as medidas necessárias para proteger e defender todos os aliados, inclusive reforçando a parte oriental da Aliança. Vamos sempre responder a qualquer deterioração do nosso ambiente de segurança, inclusive por meio do fortalecimento da nossa defesa coletiva”, disse o secretário-geral da OTAN, Jens Stoltenberg.

França e Estados Unidos se disponibilizaram para enviar forças para a OTAN, mas ainda não deram detalhes de quando nem onde.

A publicação divulgada pela OTAN termina explicando que o aumento das forças da aliança no Leste Europeu aconteceu em decorrência da “anexação da Crimeia pela Rússia” (reunificação da Crimeia à Rússia em resultado do referendo) em 2014. O bloco reforçou a presença da OTAN na região para deixar claro que um ataque a um aliado significa um ataque à OTAN.

Também nesta segunda-feira (24), o vice-ministro da Defesa, coronel-general Andrei Kartapolov, disse que vai “responder apropriadamente” caso os Estados Unidos enviem mais tropas para o Leste Europeu, segundo informações da Reuters.

O comentário foi em resposta a uma reportagem do The New York Times informando que o presidente Joe Biden cogitava enviar milhares de tropas para aliados da OTAN por conta das tensões envolvendo a situação na Ucrânia.

Questão da Crimeia

As tensões na Crimeia envolvem as transformações políticas na Ucrânia e os interesses de União Europeia, Estados Unidos e Rússia.

Localização da província da Crimeia na Ucrânia
Localização da província da Crimeia na Ucrânia

As tensões na Crimeia – província semiautônoma da Ucrânia, localizada em uma península no sul do país – revelam as relações existentes entre os ucranianos e os russos desde a extinção da União Soviética. A população dessa região, em sua ampla maioria, utiliza o idioma russo e mantém-se mais vinculada a Moscou do que propriamente a Kiev. Assim, com as recentes transformações que marcaram a política do país, a província em questão passou a tornar-se palco de extrema instabilidade política.

Os problemas internos da Ucrânia encontraram o seu ápice quando o então presidente Viktor Yanukovich refugou de um acordo que se comprometera a realizar com a União Europeia, o que ampliaria as relações do país com o bloco vizinho. Essa decisão foi diretamente influenciada pela Rússia, que não via com bons olhos esse acordo, uma vez que a Ucrânia é um dos seus principais parceiros comerciais no continente europeu.

Nesse momento, os grupos opositores ao governo constituídos majoritariamente pela população que utiliza o idioma ucraniano e que habita a porção central e oeste do país iniciaram uma onda de protestos pelas ruas das principais cidades. Os líderes desse movimento são políticos ligados ao governo anterior a Yanukovich e a partidos e movimentos de direita e de extrema-direita, com destaque para o Udar (soco), o Svoboda (liberdade) e o Setor Direito.

Diante disso, alguns meses sucederam-se com o agravamento das tensões, em que prédios públicos foram ocupados, as ruas incendiadas e a repressão aos manifestantes intensificada. Em janeiro de 2014, o então primeiro-ministro Mykola Azarov renunciou ao cargo e, no mês seguinte, o presidente Yanukovich fugiu para a Rússia após a ocupação da sede do governo pelos grupos opositores.

As regiões leste e sul, as mais industrializadas e povoadas do país, possuíam uma grande quantidade de habitantes russos, que obviamente se opuseram aos manifestantes pró-Europa. Nessas regiões, foi a província da Crimeia que conheceu, então, os níveis maiores de tensão e instabilidade política, principalmente com a atitude do novo governo de revogar uma lei que garantia o russo como idioma oficial local.

Com isso, grupos militares pró-Rússia assumiram o controle político da província e estabeleceram ali uma zona de resistência ao novo governo ucraniano, nomeando Sergei Axionov como primeiro-ministro do parlamento local. Sob esse panorama, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, teve aprovado no parlamento de seu país o pedido de envio de tropas para Ucrânia. Com isso, os países da União Europeia, além dos Estados Unidos, anunciaram o descontentamento com a decisão, iniciando uma política de articulação de um provável bloqueio econômico e/ou comercial à Rússia.Não pare agora… Tem mais depois da publicidade ;)https://fec179ad979c9521b1ba80f7e8be902b.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

No entanto, sob a argumentação de que era necessário defender os direitos humanos da população russa na Crimeia, foram enviadas tropas que rapidamente ocuparam aeroportos e bases militares na província, com alguns poucos focos de resistência. Os militares ucranianos da região, em sua ampla maioria, aliaram-se a Moscou ou abandonaram a Crimeia. Em resposta, os estadunidenses e os europeus prometeram agir no sentido de punir a Rússia pela ação realizada, considerada ilegítima pelos governos ocidentais.

Manifestantes vão às ruas, na cidade de Kahrkov, em oposição à ocupação russa na Crimeia ¹
Manifestantes vão às ruas, na cidade de Kahrkov, em oposição à ocupação russa na Crimeia ¹

Manifestantes favoráveis à intervenção da Rússia na cidade de Lugansk ²
Manifestantes favoráveis à intervenção da Rússia na cidade de Lugansk ²

De toda forma, é preciso também salientar que o que motivou a ação militar da Rússia foi o interesse na região da Crimeia, que foi anexada pela Ucrânia em 1954, quando o então líder soviético Nikita Khrushchev – de origem ucraniana – cedeu-a em caráter amistoso. Essa península possui uma importância econômica e outra estratégica, configurando-se como uma importante via de ligação entre o Mar Negro e o Mar de Arzov, servindo também de entreposto comercial para a Europa, além de ser uma grande produtora de grãos e alimentos industrializados. Por outro lado, a Europa e os Estados Unidos objetivam diminuir a influência russa na zona formada pelas ex-repúblicas da antiga União Soviética.