Bolsonaro será julgado por racismo pelo TRF-4 nesta terça

Processo foi movido pelo Ministério Público Federal, em conjunto com a Defensoria Pública da União

Menos de uma semana após ser condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Jair Bolsonaro (PL) enfrentará nesta terça-feira (16) um novo julgamento. O Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, com sede em Porto Alegre (RS), vai analisar uma ação civil pública por “declarações públicas de preconceito, discriminação e intolerância contra pessoas negras”. Em caso de condenação, esse tipo de processo não resulta em prisão, mas no pagamento de indenização.

O processo foi movido pelo Ministério Público Federal, em conjunto com a Defensoria Pública da União contra Bolsonaro e a União. O pedido é para que o ex-presidente pague indenização coletiva de pelo menos R$ 5 milhões. No caso da União, o valor é de R$ 10 milhões. Como o dano teria sido causado à sociedade, os valores seriam depositados em um fundo público.

A ação foi ajuizada em julho de 2021, quando Bolsonaro era presidente. O pedido foi negado pela primeira instância do Judiciário. Foi apresentado recurso ao TRF-4, que agendou o julgamento para esta terça. Na semana passada, o STF condenou Bolsonaro a 27 anos e três meses de prisão por entender que ele tramou um golpe de Estado.

A ação foi motivada por declarações proferidas por Bolsonaro nos arredores do Palácio da Alvorada, nos dias 4 e 6 de maio de 2021 e em 8 de julho do mesmo ano. De acordo com a acusação, ele também teria desferido ofensas em pronunciamento oficial por meio de redes sociais, na chamada “live do presidente”. Segundo a ação, “a responsabilidade da União, por sua vez, decorre diretamente da indicada conduta discriminatória do Presidente da República, dada a sua condição de representante máximo do Poder Executivo”.

Em 8 de julho, Bolsonaro fez uma brincadeira com o cabelo de uma pessoa negra, chamando de “criatório de baratas”. Em seguida, o então presidente afirmou:

– Você não pode tomar ivermectina, vai matar todos os seus piolhos.

O alvo das declarações estava entre os apoiadores de Bolsonaro e registrou, na ocasião, que não se incomodava com a piada, por não ser um “negro vitimista”.

Antes disso, em 6 de maio, Bolsonaro já tinha feito brincadeira semelhante com o mesmo apoiador:

– Tô vendo uma barata aqui.

Dois dias antes, o então presidente havia questionado outra pessoa com cabelo crespo:

– O que que você cria nessa cabeleira aí?

Em 8 de julho, Bolsonaro convidou a pessoa com quem brincou para a “live do presidente”. Na ocasião, ele tornou a brincar.

– Se eu tivesse um cabelo desse naquela época, minha mãe me cobriria de pancada.

Ele também perguntou:

– Você toma banho quantas vezes por mês?

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E fez mais brincadeiras, com sua maneira descontraída de ser.

– Se criarem cota para feios, você vai ser deputado federal.

O MPF e a DPU afirmam que as condutas de Jair Bolsonaro “extrapolam os limites da ofensa individual e específica ao cidadão presente nas ocasiões de suas manifestações, já que o discurso proferido, antes de ser direcionado a um indíviduo, configura verdadeira ofensa estigmatizante de discriminação e intolerância a qualquer pessoa negra”.

E completam:

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– A conduta do presidente da República Jair Bolsonaro visa transmutar um elemento de afirmação da identidade negra em algo sujo, execrável e que identifica um padrão fenotípico da população negra como algo que a subjugasse a uma posição social inferior, em evidente comportamento discriminatório.

A ação menciona outros episódios. Entre as declarações lembradas na ação, está uma de abril de 2017, quando Bolsonaro era deputado federal:

– Fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador ele serve mais. Mais de R$ 1 bilhão por ano é gastado (sic) com eles.

Para o MPF e a DPU, os episódios demonstram que o comportamento discriminatório de Bolsonaro contra a população negra brasileira incentivava servidores do alto escalão de seu governo a adotarem posturas igualmente discriminatórias, “em notória dissonância do dever do Estado Democrático de Direito de enfrentamento ao racismo e à desigualdade racial”.

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A ação também pede que Bolsonaro se abstenha de cometer outros atos discriminatórios e intolerantes, além de realizar retratação pública à população negra e de retirar vídeos com manifestações interpretadas como racistas de seus canais e redes sociais.