Segundo matéria do Metrópoles, Quinze anos após a deflagração da Caixa de Pandora, ao menos nove ações penais de corrupção se encaminham para acabar sem julgamento
O ex-governador José Roberto Arruda está a um passo de se livrar de nove ações penais eleitorais nas quais é acusado de corrupção, no caso da Operação Caixa de Pandora. O ex-vice-governador Paulo Octávio também deve ser beneficiado em oito processos dos quais é alvo.
Nessas ações penais, o Ministério Público do Distrito Federal e dos Territórios (MPDFT) chegou a pedir a condenação dos ex-chefes do governo do DF e de outros acusados à prisão e ao pagamento de indenização em valores que ultrapassam R$ 2,7 bilhões. Mas tudo se encaminha para dar em nada, nem ir a julgamento, após o promotor de Justiça Eleitoral do MPDFT Paulo Roberto Binicheski, reconhecer, no mês passado, que houve a prescrição dos crimes de corrupção e pedir à Justiça Eleitoral a extinção de punibilidade de Arruda, Paulo Octávio e mais 12 réus.
A Caixa de Pandora revelou o maior esquema de corrupção da história do Distrito Federal, em novembro de 2009. As investigações apontaram que a cúpula do Governo do Distrito Federal recebia propina de empresas com objetivo de pagar deputados distritais em troca de apoio político, entre 2006 e 2009.
A decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), em outubro de 2022, que condenou o ex-governador José Roberto Arruda à suspensão dos direitos políticos por 10 anos, proibição de ocupar cargos públicos e de contratar com o governo, trouxe um novo capítulo de incertezas para a política local. No entanto, recentes desenvolvimentos lançaram uma sombra sobre a integridade dessa condenação.
José Roberto Arruda, ex-governador do Distrito Federal, foi considerado culpado por captar recursos através de propina com empresas de informática contratadas pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) durante sua campanha ao Governo do DF. Essa decisão, emitida pela 4ª Turma Cível do TJDFT, parecia ter selado o destino político de Arruda, tornando-o inelegível até 2032. Além disso, em 2018, a 6ª Turma Cível também o condenou por superfaturamento de contratos com uma empresa de informática.
No entanto, a complexidade do caso aumentou em junho de 2024, quando o promotor de Justiça Eleitoral Paulo Roberto Binicheski apresentou novas manifestações à 1ª Zona Eleitoral do DF. Ele questionou a validade das famosas gravações feitas por Durval Barbosa, delator da operação Caixa de Pandora, alegando que foram produzidas sem a comprovação da existência da mídia original e sem a devida descrição dos equipamentos usados pela Polícia Federal.
As gravações de Durval Barbosa, feitas na Residência Oficial de Águas Claras e no gabinete do ex-governador, foram cruciais para a condenação de Arruda. Contudo, Binicheski afirmou que essas provas são ilícitas. Segundo ele, Barbosa desligou as escutas instaladas pela Polícia Federal no gabinete por “não se sentir confortável” e não comunicou previamente as autoridades sobre a maioria dos encontros relacionados às propinas. Apenas reuniões que ele julgou importantes para o caso foram informadas.
O promotor enfatizou que Durval Barbosa descumpriu uma ordem clara e direta do ministro Felix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao autorizar a captação ambiental no gabinete. “O que tinha caráter de lícito no início das investigações tornou-se ilícito ao final, em face do uso da máquina pública para atingir o interesse do colaborador de obter o perdão judicial e da ausência de idoneidade, uma vez que a forma de obtenção dos vídeos não condiz com a autorização judicial obtida”, afirmou Binicheski.
A decisão se baseia no Tema 979 de repercussão geral do Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou ilícitas as gravações ambientais clandestinas sem autorização judicial.
O entendimento do STF foi claro: “No processo eleitoral, é ilícita a prova colhida por meio de gravação ambiental clandestina, sem autorização judicial e com violação à privacidade e à intimidade dos interlocutores, ainda que realizada por um dos participantes, sem o conhecimento dos demais”.
Mas a longa demora do Poder Judiciário para julgar o caso, com inúmeros recursos e mudanças de instância, vai beneficiar os réus, quase 15 anos após a deflagração da operação pela Polícia Federal.
O Código Penal prevê um prazo para que haja a condenação por determinados crimes, sob risco de os delitos prescreverem. E esse prazo acabou, segundo manifestações do MPDFT apresentadas à 1ª Zona Eleitoral do DF, em junho de 2024.Play Video
Em agosto de 2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a competência para julgar o caso era do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal (TRE-DF), e não do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), onde os processos tramitavam há mais de uma década. Por isso, 10 ações penais da Caixa de Pandora mudaram para a Justiça Eleitoral. Dos 10, um tramita em segredo de Justiça.
O MPDFT se manifestou nas nove ações penais sem sigilo reconhecendo a prescrição do crime de corrupção em relação ao ex-governador Arruda, ao ex-vice-governador Paulo Octávio e a mais 12 réus.
No caso de corrupção passiva, crime do qual Arruda e Paulo Octávio eram acusados, a prescrição ocorre em 20 anos. Mas o prazo é reduzido pela metade porque os réus têm mais de 70 anos de idade. Arruda completou 70 anos em janeiro de 2024 e Paulo Octávio está com 74.
Em relação à corrupção ativa, delito imputado a empresários, a prescrição vence em 16 anos. Como os crimes teriam, em tese, começado em 2006, passaram-se 18 anos até aqui.
Inelegível
Apesar de possivelmente se livrar das ações penais eleitorais em breve, Arruda permanece inelegível em função de duas condenações cíveis, também no âmbito da Caixa de Pandora.
A 4ª Turma Cível do TJDFT condenou Arruda, em outubro de 2022, à suspensão dos direitos políticos por 10 anos, à proibição de ocupar cargos ou funções públicas e de contratar com o governo. Pela decisão do colegiado, órgão de segunda instância, Arruda está inelegível até 2032.
O ex-governador foi considerado culpado por captar recursos por meio de propina com empresas de informática contratadas pela Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) durante a campanha dele ao Governo do DF.
Arruda também foi condenado pela 6ª Turma Cível, em 2018. Nesse caso, o ex-governador respondeu por superfaturamento de contratos com empresa de informática.
Provas ilícitas
Nas manifestações apresentadas à 1ª Zona Eleitoral do DF, em junho de 2024, o promotor de Justiça Eleitoral Paulo Roberto Binicheski também pediu a decretação da nulidade das famosas gravações do delator da Caixa de Pandora, Durval Barbosa, produzidas sem a comprovação de existência da mídia original com a descrição dos equipamentos pertencentes à Polícia Federal.
Segundo o promotor, as gravações feitas por Durval na Residência Oficial de Águas Claras, em 21 de outubro de 2009, e no gabinete dele, em 23 de outubro de 2009, são provas ilícitas.
Binicheski explicou que o delator desligou as escutas instaladas pela Polícia Federal no gabinete dele “por não se sentir confortável” e não comunicou previamente as autoridades sobre a maioria dos encontros com objetivo de tratar das propinas e informou somente sobre as reuniões que “avaliou ser importante para o caso”.
O promotor ressaltou que Durval “descumpriu ordem clara e direta proferida pelo ministro Felix Fischer [do STJ] ao autorizar a captação ambiental no gabinete”.
“O que tinha caráter de lícito no início no início das investigações tornou-se ilícito ao final em face do uso da máquina pública para atingir o interesse do colaborador de obter o perdão judicial e da ausência da idoneidade, uma vez que a forma de obtenção dos vídeos não condiz com a autorização judicial obtida”, afirmou Binicheski.