Como funcionaria o impeachment de um ministro do STF

Qualquer cidadão pode apresentar a denúncia, sendo que a competência de análise é do Senado Federal.

Em 2015, mais de duas dezenas de pedidos de impeachment de ministros do Supremo foram protocolados no Senado Federal. O recordista é Gilmar Mendes, que nos últimos dias acrescentou mais um à conta: um grupo de advogados, liderados pelo jurista Modesto Carvalhosa, sustenta o magistrado exerce atividade político-partidária e pratica procedimentos incompatíveis com a honra, a dignidade e o decoro nas funções de ministro. Foi Carvalhosa também que liderou pedido de impeachment contra Ricardo Lewandowski, em dezembro de 2018, após episódio em que o ministro bateu boca com um passageiro em um voo comercial. Até agora, nenhum desses processos foi aceito pelo Senado. Mas se algum fosse, como funcionaria?

O procedimento é regido pela Lei 1.079/1950, que também regula o impeachment de presidente da República e de outros agentes públicos. Em relação aos ministros do STF, os crimes de responsabilidade estão contemplados nos artigos 39 e 39-A, e incluem, dentre outras condutas o ato de o magistrado proferir julgamento quando, por lei, for considerado suspeito na causa, além do famoso agir de modo incompatível com a honra, dignidade e decoro inerente à função.

Professor de Direito Constitucional da FGV-SP, Roberto Dias explica que qualquer cidadão pode apresentar a denúncia, sendo que a competência de análise é do Senado Federal.

A competência de análise é do Senado Federal.

“A denúncia é recebida pela mesa do Senado e deve ser lida na sessão seguinte e despachada para uma comissão especial [formada excepcionalmente para o caso] que vai opinar sobre o pedido. Depois, essa comissão tem um prazo de 10 dias para comunicar se aceita ou não [a denúncia]”, afirma, lembrando que como um processo do gênero nunca foi julgado no Brasil não há como saber se os prazos previstos na lei são, de fato, respeitados.

A partir daí, o Senado passa a funcionar como um “tribunal” de julgamento do ministro, com sessões comandadas pelo presidente do STF – caso ele seja o acusado, é seu substituto legal quem preside. Nessa fase, testemunhas são inquiridas publicamente e há debate oral, com réplica e tréplica, para que, posteriormente, os senadores possam decidir. Encerrada a discussão, o presidente do Supremo deve fazer um relatório resumido e submete o caso a nova votação, que deve ser novamente nominal, com a pergunta “o ministro [nome do ministro], acusado do crime de [tipo penal], deve ser condenado à perda do cargo?”. A resposta pode ser apenas “sim” ou “não”, e a condenação exige 2/3 dos votos dos senadores. Caso seja absolvido, o ministro faz jus ao recebimento retroativo dos vencimentos que estavam suspensos.

“Impeachment moral”

Professora da Faculdade de Direito da USP e advogada do Nelson Wilians & Advogados Associados, Maristela Basso afirma que a possibilidade de o pedido impeachment ser apresentado por qualquer cidadão demonstra que o povo tem mecanismos para controlar um agente público. Apesar de nenhum processo até hoje ter sido levado à frente na esfera jurídica, a docente afirma que muitos ministros já sofreram um “impeachment moral”.

“Alguns magistrados não podem nem andar na rua, de avião, tranquilos. Moralmente já sofreram [impedimento]. Será que precisa também de um impeachment jurídico? Diante dos obstáculos burocráticos, há esse processo moral. Esse julgamento de rua é muito mais desgastante e constrangedor”, opina.

Um que decide por muitos

O grande número de novos pedidos de impeachment de ministros do STF vem na esteira de outra tendência da Corte registrada nos últimos anos: as decisões monocráticas. Em 2017, de acordo com dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), dos 26,5 mil julgamentos de mérito realizados pelo tribunal, 13,6 mil (51,3% do total) foram realizados por um único ministro, sem a participação dos demais membros do Supremo.

Quando deixa de lado as decisões colegiadas, característica de um tribunal, o Supremo gera uma instabilidade na jurisprudência da Corte, já que em determinados momentos a sentença pode ser uma, enquanto em outros casos similares pode ser decidido de forma completamente diferente, a depender do ministro que está julgando.

Informações extraído do site gazeta do povo