O show deve continuar: Circos retomam as atividades no DF, após mais de um ano fechados

Circos montados no DF estão animados para receber o público, observando os protocolos de segurança sanitária. Liberação foi autorizada pelo governo

Respeitável público, senhoras e senhores, o espetáculo vai recomeçar! Após um ano e dois meses sem receber público na tenda, em razão da pandemia da covid-19, artistas que vivem do circo de lona estão animados para retomar as atividades no Distrito Federal. Os espetáculos foram liberados na última segunda-feira (3/5), em decreto publicado pelo governo local.

O funcionamento foi autorizado, desde que sejam respeitadas as medidas de proteção, com a lotação máxima de 50% da capacidade total, distanciamento entre as pessoas, uso de máscara pelo público e colaboradores, além de disponibilizar álcool em gel 70%.

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O Circo Real Português, montado na Avenida Elmo Serejo, em Taguatinga, tem uma data para a reabertura: dia 14. A trupe não esconde a animação de poder receber o público da forma tradicional. “Estamos ansiosos. Toda a estreia traz um nervosismo, mas, dessa vez, será algo diferente. Demoramos quase um ano para voltar à nossa vida. Parecia algo impossível. Agora, além de trazer o nosso sustento, vai deixar a nossa paixão viva. É uma nova esperança de que o circo não vai acabar”, afirma Juliana Portugal, 33 anos, trapezista e bailarina do Circo Real Português.

Juliana faz parte da quarta geração circense da família Portugal, que tem história com o circo de lona há 160 anos. Ela conta que o último ano não foi fácil. “Meu pai, que já passou pela guerra trabalhando em circo, conta que a covid-19 foi pior que a guerra”, relata. Apesar das dificuldades, a trupe resistiu e se reinventou com apresentações on-line no começo da pandemia e em formato drive-in. “Mas, com o passar dos meses, por estarmos muito tempo em um mesmo lugar, começaram a diminuir a quantidade de carros nas sessões drive-in. Sabemos que vai ser difícil a retomada com o público, a gente entende o medo da população em relação à covid-19. Mas pedimos que as pessoas acolham o circo, precisamos desse apoio”, afirma a artista.

Nesse primeiro momento, o Circo Real Português vai reabrir as portas com a limitação de 100 pessoas em cada sessão. A capacidade total do local é de 600 pessoas. “Teremos totens com álcool em gel, vamos redobrar a higienização do espaço e dos banheiros. Vamos tomar todos os cuidados sanitários para dar a maior segurança, além de termos uma boa circulação de ar na tenda”, pontua Juliana Portugal. De acordo com ela, as apresentações terão números novos que foram trabalhados durante a pandemia. “Não paramos, a gente sempre ensaia espetáculos novos. Quem assistiu no ano passado, este ano verá algo diferente”, garante. A divulgação dos dias, horários e preço das sessões será feita nas redes sociais do circo, no Instagram e Facebook.

Mesmo com a reabertura dos espetáculos presenciais, a trupe ficará no limite para conseguir se manter. As contas são caras, e até para mudar para um outro ponto a 10km é preciso uma verba de R$ 7 mil, fora os custos para manter o grupo. “Voltamos a engatinhar”, afirma Juliana.

Solidariedade

Nesse um ano e dois meses, os grupos circenses montados no Distrito Federal foram abraçados pela população local. A rede de ajuda foi grande, com a doação de cesta básica, verduras, produtos de higiene, entre outros itens de necessidade básica. “A solidariedade de Brasília é incrível. A gente viu o tanto que o brasiliense é acolhedor. Teve um dia em que estava tudo fechado e escutamos som de buzina lá fora, era um grupo de pessoas com cartazes com mensagens de apoio. Eles pararam e fizeram uma oração para a gente. Isso fez tanta diferença, receber esse carinho”, conta Joici Portugal, 35, trapezista e mágica do Circo Real Português.

Joici lembra que, no começo da pandemia, o grupo recebeu muita doação de alimentos; foi tanto que uma parte foi doada para outras entidades que estavam precisando também. “Criamos uma corrente do bem”, ressalta a artista. Além do apoio dos moradores, o grupo foi acolhido pela administração local. “O administrador ajudou muito, veio aqui, disse que a gente poderia ficar o tempo que precisasse. Demonstrou total apoio e entendeu o nosso lado, de não poder ir para um outro local durante a pandemia”, relata Juliana Portugal. De acordo com ela, o ponto na Elmo Serejo era onde o Circo Real Português ia ficar menos tempo parado, a expectativa inicial era de 21 dias. “É uma situação bem atípica, ficar mais de um ano em um lugar só. Não imaginávamos isso”, pontua Juliana.

Na região do Guará, o Circo Vitória tem sobrevivido pelas doações recebidas da comunidade local e pelo incentivo da Lei Aldir Blanc, liberada no final do ano passado. Sem a possibilidade de fazer espetáculos em drive-in, pelo local onde a tenda foi montada — no gramado atrás da 4ª Delegacia de Polícia — e sem verba para realizar as apresentações em live, o grupo se viu ilhado sem poder trabalhar da arte. “Eu tenho 60 anos de idade, 40 deles trabalhando em circo, e posso dizer: uma situação dessa não é fácil. Sou eternamente grata por estar no local onde estou. Fui bem recebida e acolhida aqui”, ressalta Loiri Mocellin, 60, proprietária do Circo Vitória.

Dificuldades

Para quem depende da venda de bilheteria para sobreviver, passar mais de um ano com as portas fechadas é desesperador. Loiri conta que muitos artistas tiveram que se reinventar para pagar as contas, como foi o caso de Wellington Portugal, 52, e Jordi Carlos Mocellin de Almeida, 25, que estão trabalhando com diária em um lava jato. Wellington faz parte do número do globo da morte e Jordi é trapezista e malabarista, os dois estão ansiosos para retornar a trabalhar com a paixão vivenciada no circo. Outros integrantes passaram a vender balão luminoso na Torre de TV. No começo da pandemia, com alguns meses sem poder trabalhar, Loiri Mocellin também costurou máscaras para vender. De acordo com ela, a produção deu um respiro nas contas durante alguns meses.

Para o retorno, o grupo ainda não tem uma previsão. Com a lona desmontada, para evitar o desgaste pela ação do tempo, a estrutura do trapézio ficou enferrujada com as chuvas e perderam a cor. Os motores dos veículos também estragaram pelo tempo parado. A trupe terá que investir na manutenção dos equipamentos, além de se adequar nos protocolos necessários para o funcionamento. “Estamos aguardando para saber quais serão as exigências burocráticas. Vamos fazer o possível e o impossível para reabrir”, destaca Loiri, que agradeceu também a Secretaria de Cultura pelo apoio que tem dado aos artistas de circo de lona.

Desafio

Outra família circense enfrenta o mesmo desafio de recuperar os equipamentos e artistas para voltar com os espetáculos. “A maioria dos artistas saíram ao longo do último ano, muitos conseguiram outros empregos ou mudaram de cidade. Vamos ter que contratar artistas, fazer a divulgação, adaptar o local com as medidas de prevenção”, diz Reinaldo Gadilho Roca, 30, um dos proprietários do Circo Rocca que atualmente está montado com o nome Circo de México, em uma área próxima à rodoviária de Sobradinho.

“Quando começou a pandemia, não imaginávamos a proporção que ia tomar. Nós, artistas de circo de Brasília, pensávamos que íamos ficar no máximo dois a três meses parados. Quando esse período passou, não tínhamos mais renda. O jeito que encontramos foi pedir ajuda para a população, que nos acolheu”, relata Reinaldo.

Diferentemente do Circo Real Português e do Circo Vitória, que tiveram alguns dias com espetáculos antes de fechar os espaços, o Circo de México não chegou a ter apresentação. “Estávamos esperando um laudo do Corpo de Bombeiros para poder abrir, quando saiu o decreto do primeiro lockdown”, afirma o artista. Para se manter, a trupe também vendeu algodão-doce, maçã do amor e balão de led. Com a possibilidade de retorno, Reinaldo está animado.

Fonte: correio Braziliense