Enquanto Rollemberg reclama: Saúde centraliza nova crise no governo

    Rollemberg se diz decepcionado com a deslealdade diante da gestão: crise com Santana
    POR HELENA MADER E OTÁVIO AUGUSTO – CORREIO BRAZILIENSE –

    Enquanto Rollemberg reclama da postura de integrantes do governo ante denúncias de corrupção, oposição se reúne para turbinar a CPI da Saúde. Vice-governador será chamado para prestar esclarecimentos. Contratação de organizações sociais alimenta embate político. …

    As gravações da presidente do Sindicato dos Servidores da Saúde (SindSaúde), Marli Rodrigues, bombardearam a relação entre governador e vice. Nos bastidores, o clima já era de desconforto. Rodrigo Rollemberg (PSB), em entrevistas, ontem, não escondeu o descontentamento com Renato Santana (PSD). O chefe do Buriti afirmou que está decepcionado com a “deslealdade” com a gestão. A crise deixou o governo vulnerável a ataques na CPI da Saúde, liderada pela oposição. Em reação às denúncias, a Câmara Legislativa fez uma convocação extraordinária para investigar o caso durante o recesso, o que colaborou para deteriorar o clima político. Santana será convidado a prestar esclarecimentos na Casa. Marli Rodrigues já foi convocada e deve comparecer na próxima quinta-feira. A repercussão pode atrapalhar os planos do governo em contratar organizações sociais (OSs) para gerir unidades da Secretaria de Saúde.

    A polêmica começou na semana passada, com a divulgação de conversas gravadas pela presidente do SindSaúde com interlocutores do governo. Em um dos áudios, Santana admite saber da existência de um repasse de propina no valor de 10% dos contratos de serviços da Secretaria de Fazenda. Na gravação, a sindicalista diz ainda ter conhecimento de um esquema similar na Secretaria de Saúde, que chegaria a 30%. O governador Rodrigo Rollemberg (PSB) determinou que a Controladoria-Geral do DF apure o caso e garantiu que a Polícia Civil abriu investigação. O chefe do Executivo também entrou com uma queixa-crime contra Marli Rodrigues.

    O PSB-DF, partido do governador, divulgou nota para defendê-lo das especulações. Para o comando da legenda, as denúncias têm relação com a decisão de Rollemberg de enfrentar “interesses poderosos e escusos”. “Recentemente, o governo propôs, entre outras ações, a implantação de organizações sociais no atendimento primário à saúde. Esse modelo de gestão tem causado reações desproporcionais por parte de alguns sindicalistas que, a todo momento, tentam confundir a população e os servidores da saúde com informações equivocadas”, argumenta o PSB.

    A decisão da Câmara Legislativa de fazer uma convocaçãoextraordinária desagradou ao governo. A determinação agora é dar explicações convincentes para tentar esvaziar a mobilização dos deputados. A presidente da Casa, Celina Leão (PPS), determinou a convocação no recesso. Adversária de Rollemberg, ela aproveita a crise na saúde para desferir golpes contra o governo na CPI e projetar seus planos políticos. “A crise é extremamente grave e exige da Câmara uma resposta. Temos uma CPI da Saúde e ela precisa trabalhar nesse caso com urgência”, explicou Celina.

    O secretário adjunto de Relações Institucionais do GDF, José Flávio de Oliveira, ficou surpreso com a convocação extraordinária para funcionamento exclusivo da CPI da Saúde. “Nunca vi isso. Normalmente, esse tipo de convocação é para que haja funcionamento pleno da Casa, inclusive do plenário. Mas se a Câmara decidiu assim, vamos nos curvar à vontade dos distritais e apresentar todas as explicações necessárias. É interesse do governo esclarecer esse caso”, disse José Flávio. “O vice-governador deve ser convidado. Ele não é obrigado a comparecer, mas está disposto a ir até a Câmara”, esclareceu o responsável pela articulação do GDF com a Câmara.

    O líder do governo na Casa, deputado Júlio César (PRB), acredita que será preciso, em primeiro lugar, ouvir Marli Rodrigues e o vice-governador antes de definir os próximos passos da CPI da Saúde. “É papel dos deputados investigar a atuação do governo, independentemente de integrar a base ou a oposição. Estamos em uma situação confortável porque o governador está muito tranquilo com relação a isso”, comenta o parlamentar. A convocação extraordinária da Câmara valerá até 31 de julho e não haverá pagamento de salários extras por conta do trabalho durante o recesso. Em nota, Marli Rodrigues, do SindSaúde, informou que só vai se pronunciar sobre o episódio depois que os áudios gravados por ela “forem entregues a órgãos totalmente isentos e com competência para investigar os supostos crimes”.

    Celina, aliada do governo no início do mandato, aproveita a situação para alavancar a CPI da Saúde

    Críticas

    O Executivo local anunciou, no segundo semestre do ano passado, que a gestão de parte da saúde pública passaria a ser feita por organizações sociais (OSs). A fim de frear o avanço da medida, cerca de 20 sindicatos da área da saúde organizaram um movimento contra o projeto. Em 2 de agosto, o grupo realizará uma assembleia geral, em frente à unidade de pronto atendimento (UPA) de Ceilândia.

    Além disso, as entidades protocolaram na Câmara o pedido de formação de uma frente parlamentar contra a implantação das organizações sociais e pressionam os deputados a aprovarem uma emenda à Lei Orgânica que proíbe o modelo de gestão. O Ministério Público (MPDFT), o Tribunal de Contas (TCDF), o Ministério Público de Contas (MPCDF) e o Ministério Público do Trabalho (MPTDF) já manifestaram contrariedade ao modelo de gestão. No próximo mês, o Conselho de Saúde do DF deve apresentar um projeto ao Executivo local que prevê a reformulação da atenção primária, mas sem a gestão das OSs.

    Discussão nacional

    As mazelas na saúde obrigaram pelo menos 18 unidades da Federação a transferir a administração de hospitais públicos para as OSs, entre elas: Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco e Goiás. Alane Ribeiro, diretora do Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes), avalia que o sistema é frágil, e em capitais como São Paulo e Goiânia apresenta resultados piores que os da administração direta. “O aumento do financiamento não acompanha a ampliação de assistência e do número de procedimentos. Além disso, o gasto com a aquisição de medicamentos e a manutenção de equipamentos possuem informações”, critica a especialista.

    João Paulo Machado Peixoto, professor do departamento de Administração e coordenador do Núcleo de Estudos em Gestão Pública (Negep) da Universidade de Brasília (UnB), acredita que “qualquer medida que descentralize a administração é saudável”. “A legislação que rege a administração pública sufoca e dificulta a ação governamental”, pontua Peixoto, ao ressaltar que o Estado possui bons mecanismos de controle. Vitor Gomes Pinto, integrante do Observatório da Saúde e especialista em administração pública, concorda. “Temos um sistema que não está funcionando. Não há como deixar como está”, completa.

    Polêmica

    O modelo de gestão goiano é protagonista de um impasse entre o governo e o Ministério Público de Goiás (MPGO). Lá, o assunto é tratado no âmbito da Justiça. A maior celeuma envolve o aumento de 28% no gasto público com o setor. Existem, ao menos, quatro ações tramitando desde 2012 que questionam a terceirização dos serviços e aspectos considerados irregulares dos contratos. Hoje, são 14 hospitais estão sob responsabilidade de terceiros — inclusive os quatro principais a capital.

    Entenda o caso

    Os planos o Buriti

    O GDF, ancorado no bom desempenho do Hospital da Criança de Brasília, gerido pela Associação Brasileira de Assistência às Famílias de Crianças Portadoras de Câncer e Hemopatias (Abrace), acredita que as OSs sejam o caminho para debelar a insalubridade na saúde. A proposta do Palácio do Buriti prevê acordos de 10 anos, podendo ser renovados por até 35. Além da exigência da formação de um conselho fiscal para o controle dos gastos, a cada dois meses as organizações sociais terão de publicar balanços de gestão. Com a publicação da lei, o governo passará a prever programação orçamentária para o financiamento do modelo no Plano Plurianual e na Lei Orçamentária Anual.

    O Executivo local desembolsa, por ano, R$ 132 milhões para custear a atenção primária em Ceilândia. Com o novo modelo de gestão, a estimativa cairia para R$ 110 milhões. Há ainda o gasto de R$ 148 milhões para despesas das UPAs. A ideia é ampliar a cobertura da atenção básica de 30,7% para 62% até 2018. .

     

     

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